segunda-feira, 27 de maio de 2013

Recifense vai de carro até a esquina

As desculpas são muitas: calor, buracos nas calçadas, falta de segurança e vias mal iluminadas
Ed Wanderley

Chegou a hora de voltar do trabalho ou faculdade e você lembra que deve comprar pães: chegar em casa e aproveitar para "esticar as pernas", caminhando, ou fazer uma parada estratégica no caminho? E para ir à farmácia ou restaurante que ficam a duas ruas de distância, ou visitar um conhecido a três quadras de casa e etc? A resposta natural, e racional, seria aproveitarmos essas oportunidades para a "atividade física nossa de cada dia". Na prática, o recifense tende a optar pelo automóvel em todas essas situações. Comodidade, hábito, falta de tempo, intolerância às altas temperaturas ou simplesmente receio da falta de infraestrutura e segurança que as ruas da cidade podem oferecer. Por mais diversas que sejam as justificativas, elas revelam uma sociedade mais sedentária e menos conectada ao local onde vive. O resultado acaba sendo não apenas um crescente problema de mobilidade urbana, mas também de saúde pública que, pelos indícios, está longe de encontrar uma solução.

De acordo com uma pesquisa da Sociedade Brasileira de Cardiologia, o Nordeste é a região com o menor índice de pessoas fisicamente ativas do país (48%). Para o Doutor em Nutrição da Universidade de Pernambuco, Wagner Luiz Prado, a tendência é bastante forte na capital pernambucana, uma das menos ativas do Brasil. "Percebemos que a atividade acaba mais atrelada ao lazer. No cotidiano, as pessoas preferem a comodidade", explica.

A situação é tão alarmante que uma pesquisa desenvolvida na própria UPE mostra que o problema existe mesmo entre os universitários ingressantes em cursos de saúde, que deverão lidar profissionalmente com questões como obesidade, qualidade de vida e prevenção de doenças. Os resultados apontaram que menos da metade exercem exercícios físicos regulares e que uma média de 10% dos jovens de cursos como Educação Física e Enfermagem apresentavam sobrepeso. "As pessoas não entendem que a questão vai além da estética ou da preservação cardiovascular. Atividade física significa qualidade de vida", complementou.


Hilton Costa. Foto: Teresa Maia/DP/D.A.Press
"Prefiro ir trabalhar de ônibus"
- Hilton Costa

Segundo o presidente do Instituto Pelópidas Silveira, Milton Botler, foi criada, no Recife, uma cultura vulgar, mal vista no mundo inteiro, que torna as pessoas reféns do automóvel. "Isso é ruim para a saúde e para a própria cidade", explica. A "culpada" seria a sensação de insegurança em toda a cidade, fato que independe da própria criminalidade ou de infraestrutura. "É uma questão de 'percepção'. Se as pessoas não se sentem seguras acabam em uma cidade cujos prédios têm altos muros e seus moradores abandonam os espaços públicos. Os bairros em que as calçadas apresentam melhores condições de uso são justamente onde elas ficam mais abandonadas", avalia.

Contrariando o que parece ser uma maioria, Hilton Costa, 48, busca ao máximo evitar o uso do próprio carro. Apesar de residir no bairro de Piedade, em Jaboatão dos Guararapes, e trabalhar no bairro da Boa Vista, no Recife, o publicitário estima que 80% de seus percursos sejam realizados a pé. "Planejo meu dia. Só uso o automóvel quando sei que vou me deslocar para longe e com pouco tempo. Prefiro ir trabalhar de ônibus. Nas áreas próximas ao centro, caminhando consigo chegar aos locais sem maiores atrasos e em menos tempo, sem preocupação com estacionamentos, que quase não existem", explica, com a simplicidade lógica dos poucos pernambucanos que fazem este tipo de trajeto por opção.


Nenhum comentário :

Postar um comentário