Entrevista: Evaldo Araújo Integrante do Focco-PE
Um decreto do então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2010, foi o pontapé inicial para uma discussão nacional em torno da transparência nas gestões públicas. De alguns anos para cá, o Brasil vem avançando nessa área, mas ainda há muito para ser feito e é isso que explica Evaldo Araújo, do Fórum de Combate à Corrupção de Pernambuco - Focco-PE. Segundo ele, a discussão que vem sendo travada, através de conferências realizadas, primeiramente, nos municípios, em seguida nos estados para culminar em uma conferência nacional, no próximo mês, pretende consolidar um plano nacional que vai guiar as ações rumo a um País mais transparente, no qual a sociedade terá controle dos gastos públicos.
O que é essa transparência tão discutida e que vem se buscando nas administrações públicas?
Todo gestor público tem o dever de prestar contas. Antigamente, prestar contas para a sociedade era criar um balancete colocar na parede da prefeitura, ou no Diário Oficial, mas isso não é transparência. Ser transparente é disponibilizar as informações, dizendo o que faz, porque faz, quando fará, por quanto fará, com que objetivos. Isso tudo, periodicamente e de forma clara e simples, que o cidadão entenda o que está ocorrendo. Então, quando ele colocar que vai ter um recurso para o programa de erradicação da Aedes Aegypti, tem que colocar claramente: “programa para finalizar a dengue”. O que se tem hoje de concreto, já no ordenamento, é uma lei que é chamada de Lei da Transparência, de junho de 2009, que alterou a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ela estabeleceu que a partir de junho de 2010 toda a União, todos os estados e os municípios com mais de 100 mil habitantes teriam que criar portais da transparência e disponibilizar, em tempo real, na internet, todas as informações de despesa e de receita. Então, hoje, a União já divulga através do portal da transparência que é mantido pela Controladoria Geral da União. Pernambuco também tem um portal da transparência do Governo do Estado e que, inclusive, ganhou um prêmio de destaque como sendo um dos portais mais transparentes do País, junto com o portal da União e do governo de São Paulo. Em junho de 2011, todos os municípios com mais de 50 mil habitantes também já ficaram obrigados a essa lei, e, em junho de 2013, todos os municípios do Brasil vão estar obrigados a divulgar na internet todas as informações de despesas e receitas de forma clara e simples para população.
Essa Lei resolve o problema da falta de transparência?
Não. Esse é um dos mecanismos e que têm alguns problemas, por exemplo, nem todos têm acesso à internet e, por isso, estão sendo discutidos meios de atingir essas pessoas. Outra dificuldade é que nem todos com acesso à internet estão capacitados a colher esses dados divulgados nos portais e, finalmente, a linguagem utilizada nos portais ainda não é a ideal, nem nos portais premiados. Ainda existem dificuldades, é preciso melhorar esses portais. Agora existe uma questão central: a sociedade precisa se engajar e participar, porque já existem alguns espaços conquistados, já postos na legislação, mas existe outro conjunto de espaços que estão sendo disputados. Existem outros desafios legais, como o da implantação de um sistema mais amplo para dar transparência aos convênios, a todos os repasses da União para os municípios e estados e a aplicação desses recursos. Trata-se de um sistema chamado Siconv, que já está estruturado, mas há certa resistência de determinados setores, apesar de a presidente Dilma ter baixado um decreto este ano e ter tornado obrigatório o uso do Siconv, então a gente tem a expectativa de que, no segundo semestre, isso aí também seja cumprido.
Mas para que a população participe ela não precisa ser educada para isso?
A sociedade reclama bastante da falta de capacitação e a gente reconhece que a linguagem que trata dessas questões, que é a lei, a parte jurídica e a parte contábil, são linguagens chatas para todos. De certa forma, os órgãos que trabalham com controle têm políticas de capacitação, que não são abrangentes, mas, por exemplo, o TCU tem uma ação chamada Diálogo Público, que busca interagir com a sociedade; a Controladoria Geral da União tem o Olho Vivo no Dinheiro Público, que percorre os municípios; o TCE tem um programa chamado Tecendo a Cidadania, que a Escola de Contas Públicas Barreto Guimarães mantém; o TCU também mantém cursos on-line. Então, há um esforço desses órgãos com relação a isso, mas claro que não atende a toda a demanda porque temos um País continental, que tem mil desafios. Essa questão da capacitação da sociedade é bastante complexa, a educação no País é um problema central que precisa ser enfrentado.
Como se consegue mobilizar e engajar as massas?
O processo de mobilização da sociedade cabe à própria sociedade civil. Tem momentos que ela tem uma maior organização e dá respostas a determinadas questões, e tem momentos que ela fica mais apática, mais desencantada com o processo. É difícil interferir nisso. Com relação aos órgãos de controle como o Fórum de Combate à Corrupção, a gente tenta sempre trazer as pessoas para a discussão, tem eventos que mobilizam, como, por exemplo, marcar um ato no Dia do Combate à Corrupção, realizar seminários, interagir com universidades, escolas. Tem também os parceiros históricos na mobilização da sociedade e até para a própria transparência, como a Imprensa, que é um parceiro ímpar na questão do controle social; as mídias sociais também são parceiras importantes; canais criados como as ouvidorias também são mecanismos de mobilização. Na sociedade a gente acredita nos mecanismos normais como os conselhos de bairro, os clubes de mães, as igrejas.
Em 2010, o então presidente Lula baixou um decreto convocando o País para a realização da 1ª Conferência sobre Transparência e Controle Social. Essa iniciativa fez com que municípios e estados também realizassem suas conferências e formulassem propostas para serem enviadas para a etapa nacional, que será realizada em maio. O que vai acontecer no final de todo esse processo?
As propostas que foram sistematizadas nos municípios e estados, incluindo Pernambuco, e que serão consolidadas na etapa nacional, vão constituir o Plano Nacional de Transparência e Controle Social. Esse documento com as propostas serão entregues, ao final do evento, à presidente Dilma Rousseff.
Isso significa que as propostas serão colocadas em prática?
Não, significa que elas serão entregues a principal mandatária do País em busca do compromisso dela para colocar as propostas em prática. É claro que, algumas propostas, impõem mudanças legislativas e vai ter que envolver os setores do legislativo. Por isso, uma grande orientação do ponto de vista da Conferência Nacional é que sejam propostas possíveis de serem efetivadas, por exemplo, não se deve mandar propostas do tipo que impõe uma emenda constitucional, porque essa proposta não teria uma efetividade de imediato. Mas propor a regulamentação dos mecanismos de participação direta pode ser uma das exigências que conste no plano, a inclusão na grade curricular de uma disciplina sobre controle social das gestões, são propostas exequíveis, com possibilidades de serem efetivas e com a aplicação o mais imediata possível, e com o retorno o mais imediato possível.
Como será construído esse plano, de que maneira ele vai contemplar todas as demandas?
As propostas foram discutidas até agora divididas em quatro eixos temáticos: o eixo um trata especificamente do aumento da questão da transparência; o dois da questão do engajamento, da mobilização e da capacitação da sociedade, para que ela possa exercer o controle social; o três especificamente dos conselhos de políticas públicas; e o último trata efetivamente de mecanismos de combate à corrupção. A gente considera que este assunto não se esgota, essa discussão sobre transparência e controle social está relacionada com outras questões da sociedade, uma em especial é a questão da reforma política. Então, existem propostas que serão inseridas na discussão da reforma política. Aí tem mil e uma coisas: orçamento participativo, lei de iniciativas populares, discussão do acesso à informação, mais transparência e mais fiscalização por parte da população, estruturação dos conselhos, políticas de capacitação, criação de escolas para conselhos ou de cursos, inclusão na grade curricular de matérias que tratem de transparência de gestão, entre outras.
Pernambuco teve apenas 33 conferências municipais. O engajamento foi pequeno?
Foram 33 conferências, mas envolveram 75 municípios, ou seja, quase 40% do Estado. Já é um número significativo. Claro que o grande objetivo é que houvesse um número maior, mas não necessariamente um estado que tenha tido menos conferências municipais, tenha tido também menos engajamento. As conferências ocorreram nos municípios, a princípio, através de decreto do prefeito, convocando o evento. Caso o gestor não convocasse até um determinado período, a sociedade civil passava a ter o poder de convocar. Então, teve estado que os prefeitos convocavam em bloco, mas a população não se engajava. A participação tem que se medir por outros modelos. Em Pernambuco, teve municípios que o prefeito não convocou e que a sociedade civil se mobilizou e isso muitas vezes é mais importante do que o decreto. O desafio do engajamento é um desafio da sociedade.
Como este plano que está sendo construído vai ajudar a combater a corrupção?
No momento em que a agente tem uma conferência nacional, a gente cria também uma nova rede. É a primeira conferência que trata da transparência e inclui o combate à corrupção e isso certamente cria uma rede de controle mais interessante. E estão acontecendo também conferências virtuais, abertas para qualquer cidadão brasileiro lançar proposta, e as conferências livres, para quem não está atrelado a nenhum setor. Se você, na sua empresa ou no grupo de estudo, juntar dez pessoas que querem criar propostas isso pode ser feito e enviado diretamente para a conferência nacional. Então, você acaba criando uma rede de pessoas que tem interesse sobre o tema e isso já fortalece o combate à corrupção.
Um decreto do então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2010, foi o pontapé inicial para uma discussão nacional em torno da transparência nas gestões públicas. De alguns anos para cá, o Brasil vem avançando nessa área, mas ainda há muito para ser feito e é isso que explica Evaldo Araújo, do Fórum de Combate à Corrupção de Pernambuco - Focco-PE. Segundo ele, a discussão que vem sendo travada, através de conferências realizadas, primeiramente, nos municípios, em seguida nos estados para culminar em uma conferência nacional, no próximo mês, pretende consolidar um plano nacional que vai guiar as ações rumo a um País mais transparente, no qual a sociedade terá controle dos gastos públicos.
O que é essa transparência tão discutida e que vem se buscando nas administrações públicas?
Todo gestor público tem o dever de prestar contas. Antigamente, prestar contas para a sociedade era criar um balancete colocar na parede da prefeitura, ou no Diário Oficial, mas isso não é transparência. Ser transparente é disponibilizar as informações, dizendo o que faz, porque faz, quando fará, por quanto fará, com que objetivos. Isso tudo, periodicamente e de forma clara e simples, que o cidadão entenda o que está ocorrendo. Então, quando ele colocar que vai ter um recurso para o programa de erradicação da Aedes Aegypti, tem que colocar claramente: “programa para finalizar a dengue”. O que se tem hoje de concreto, já no ordenamento, é uma lei que é chamada de Lei da Transparência, de junho de 2009, que alterou a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ela estabeleceu que a partir de junho de 2010 toda a União, todos os estados e os municípios com mais de 100 mil habitantes teriam que criar portais da transparência e disponibilizar, em tempo real, na internet, todas as informações de despesa e de receita. Então, hoje, a União já divulga através do portal da transparência que é mantido pela Controladoria Geral da União. Pernambuco também tem um portal da transparência do Governo do Estado e que, inclusive, ganhou um prêmio de destaque como sendo um dos portais mais transparentes do País, junto com o portal da União e do governo de São Paulo. Em junho de 2011, todos os municípios com mais de 50 mil habitantes também já ficaram obrigados a essa lei, e, em junho de 2013, todos os municípios do Brasil vão estar obrigados a divulgar na internet todas as informações de despesas e receitas de forma clara e simples para população.
Essa Lei resolve o problema da falta de transparência?
Não. Esse é um dos mecanismos e que têm alguns problemas, por exemplo, nem todos têm acesso à internet e, por isso, estão sendo discutidos meios de atingir essas pessoas. Outra dificuldade é que nem todos com acesso à internet estão capacitados a colher esses dados divulgados nos portais e, finalmente, a linguagem utilizada nos portais ainda não é a ideal, nem nos portais premiados. Ainda existem dificuldades, é preciso melhorar esses portais. Agora existe uma questão central: a sociedade precisa se engajar e participar, porque já existem alguns espaços conquistados, já postos na legislação, mas existe outro conjunto de espaços que estão sendo disputados. Existem outros desafios legais, como o da implantação de um sistema mais amplo para dar transparência aos convênios, a todos os repasses da União para os municípios e estados e a aplicação desses recursos. Trata-se de um sistema chamado Siconv, que já está estruturado, mas há certa resistência de determinados setores, apesar de a presidente Dilma ter baixado um decreto este ano e ter tornado obrigatório o uso do Siconv, então a gente tem a expectativa de que, no segundo semestre, isso aí também seja cumprido.
Mas para que a população participe ela não precisa ser educada para isso?
A sociedade reclama bastante da falta de capacitação e a gente reconhece que a linguagem que trata dessas questões, que é a lei, a parte jurídica e a parte contábil, são linguagens chatas para todos. De certa forma, os órgãos que trabalham com controle têm políticas de capacitação, que não são abrangentes, mas, por exemplo, o TCU tem uma ação chamada Diálogo Público, que busca interagir com a sociedade; a Controladoria Geral da União tem o Olho Vivo no Dinheiro Público, que percorre os municípios; o TCE tem um programa chamado Tecendo a Cidadania, que a Escola de Contas Públicas Barreto Guimarães mantém; o TCU também mantém cursos on-line. Então, há um esforço desses órgãos com relação a isso, mas claro que não atende a toda a demanda porque temos um País continental, que tem mil desafios. Essa questão da capacitação da sociedade é bastante complexa, a educação no País é um problema central que precisa ser enfrentado.
Como se consegue mobilizar e engajar as massas?
O processo de mobilização da sociedade cabe à própria sociedade civil. Tem momentos que ela tem uma maior organização e dá respostas a determinadas questões, e tem momentos que ela fica mais apática, mais desencantada com o processo. É difícil interferir nisso. Com relação aos órgãos de controle como o Fórum de Combate à Corrupção, a gente tenta sempre trazer as pessoas para a discussão, tem eventos que mobilizam, como, por exemplo, marcar um ato no Dia do Combate à Corrupção, realizar seminários, interagir com universidades, escolas. Tem também os parceiros históricos na mobilização da sociedade e até para a própria transparência, como a Imprensa, que é um parceiro ímpar na questão do controle social; as mídias sociais também são parceiras importantes; canais criados como as ouvidorias também são mecanismos de mobilização. Na sociedade a gente acredita nos mecanismos normais como os conselhos de bairro, os clubes de mães, as igrejas.
Em 2010, o então presidente Lula baixou um decreto convocando o País para a realização da 1ª Conferência sobre Transparência e Controle Social. Essa iniciativa fez com que municípios e estados também realizassem suas conferências e formulassem propostas para serem enviadas para a etapa nacional, que será realizada em maio. O que vai acontecer no final de todo esse processo?
As propostas que foram sistematizadas nos municípios e estados, incluindo Pernambuco, e que serão consolidadas na etapa nacional, vão constituir o Plano Nacional de Transparência e Controle Social. Esse documento com as propostas serão entregues, ao final do evento, à presidente Dilma Rousseff.
Isso significa que as propostas serão colocadas em prática?
Não, significa que elas serão entregues a principal mandatária do País em busca do compromisso dela para colocar as propostas em prática. É claro que, algumas propostas, impõem mudanças legislativas e vai ter que envolver os setores do legislativo. Por isso, uma grande orientação do ponto de vista da Conferência Nacional é que sejam propostas possíveis de serem efetivadas, por exemplo, não se deve mandar propostas do tipo que impõe uma emenda constitucional, porque essa proposta não teria uma efetividade de imediato. Mas propor a regulamentação dos mecanismos de participação direta pode ser uma das exigências que conste no plano, a inclusão na grade curricular de uma disciplina sobre controle social das gestões, são propostas exequíveis, com possibilidades de serem efetivas e com a aplicação o mais imediata possível, e com o retorno o mais imediato possível.
Como será construído esse plano, de que maneira ele vai contemplar todas as demandas?
As propostas foram discutidas até agora divididas em quatro eixos temáticos: o eixo um trata especificamente do aumento da questão da transparência; o dois da questão do engajamento, da mobilização e da capacitação da sociedade, para que ela possa exercer o controle social; o três especificamente dos conselhos de políticas públicas; e o último trata efetivamente de mecanismos de combate à corrupção. A gente considera que este assunto não se esgota, essa discussão sobre transparência e controle social está relacionada com outras questões da sociedade, uma em especial é a questão da reforma política. Então, existem propostas que serão inseridas na discussão da reforma política. Aí tem mil e uma coisas: orçamento participativo, lei de iniciativas populares, discussão do acesso à informação, mais transparência e mais fiscalização por parte da população, estruturação dos conselhos, políticas de capacitação, criação de escolas para conselhos ou de cursos, inclusão na grade curricular de matérias que tratem de transparência de gestão, entre outras.
Pernambuco teve apenas 33 conferências municipais. O engajamento foi pequeno?
Foram 33 conferências, mas envolveram 75 municípios, ou seja, quase 40% do Estado. Já é um número significativo. Claro que o grande objetivo é que houvesse um número maior, mas não necessariamente um estado que tenha tido menos conferências municipais, tenha tido também menos engajamento. As conferências ocorreram nos municípios, a princípio, através de decreto do prefeito, convocando o evento. Caso o gestor não convocasse até um determinado período, a sociedade civil passava a ter o poder de convocar. Então, teve estado que os prefeitos convocavam em bloco, mas a população não se engajava. A participação tem que se medir por outros modelos. Em Pernambuco, teve municípios que o prefeito não convocou e que a sociedade civil se mobilizou e isso muitas vezes é mais importante do que o decreto. O desafio do engajamento é um desafio da sociedade.
Como este plano que está sendo construído vai ajudar a combater a corrupção?
No momento em que a agente tem uma conferência nacional, a gente cria também uma nova rede. É a primeira conferência que trata da transparência e inclui o combate à corrupção e isso certamente cria uma rede de controle mais interessante. E estão acontecendo também conferências virtuais, abertas para qualquer cidadão brasileiro lançar proposta, e as conferências livres, para quem não está atrelado a nenhum setor. Se você, na sua empresa ou no grupo de estudo, juntar dez pessoas que querem criar propostas isso pode ser feito e enviado diretamente para a conferência nacional. Então, você acaba criando uma rede de pessoas que tem interesse sobre o tema e isso já fortalece o combate à corrupção.
Fonte:http://www.folhape.com.br/cms/opencms/folhape/pt/edicaoimpressa/arquivos/2012/Abril/09_04_2012/0033.html
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